As Três Ecologias
Ao registrar as "Três Ecologias" - a do meio ambiente, a das relações sociais e a da subjetividade humana - (a esta articulação dá se o nome de “ecosofia”) Guattari manifesta sua indignação perante um mundo que se deteriora lentamente: "O que está em questão é a maneira de viver daqui em diante sobre o planeta, no contexto da aceleração das mutações técnico-científicas e do considerável crescimento demográfico. Em virtude do contínuo desenvolvimento do trabalho maquínico, redobrado pela revolução da informática, as forças produtivas vão tornar disponível uma quantidade cada vez maior do tempo de atividade humana potencial. Mas com que finalidade? A do desemprego, da marginalidade opressiva, da solidão, da ociosidade, da angústia, da neurose, ou a da cultura, da criação, da pesquisa, da reinvenção do meio ambiente, do enriquecimento dos modos de vida e de sensibilidade?" Existe a necessidade de rever a estrutura das classes sociais, o estabelecimento e cumprimento de regras universais dos direitos humanos, o reconhecimento da interdependência entre os seres e da complexa teia de relações entre eles.
A subjetividade, através de chaves transversais, se instaura ao mesmo tempo no mundo do meio ambiente, dos grandes agenciamentos sociais e institucionais e, simetricamente, no seio das paisagens e dos fantasmas que habitam as mais íntimas esferas do indivíduo. A reconquista de um grau de autonomia criativa num campo particular invoca outras reconquistas em outros campos. Assim, toda uma catálise da retomada de confiança da humanidade em si mesma está para ser forjada passo a passo e, às vezes, a partir dos meios os mais minúsculos.
Independente da camada social em que estão inseridos os indivíduos, precisamos de pessoas destituídas de tanto ego. Precisamos de pessoas que falem de uma forma que todos entendam o que está sendo dito. Esta linguagem precisa ser, vir e falar ao coração, num processo de vir e ir de dentro e para dentro. O fora está subjetivando demais a humanidade como um todo. Precisamos de pessoas que falem a linguagem do coração e que não se sintam donos do conhecimento e nem retêm-os para lhes aumentar o poder. É imprescindível que encontremos enunciados que operem, de forma prática e reconhecida, por toda comunidade científica e a não científica também, como alternativas eficazes na ruptura a significantes. E o afeto e o percepto são modos de apreensão absolutamente complementares, afirma Guattari (1989).
Acreditamos que, caminhar em busca de uma re-significação de valores e de construção de novas subjetivações, implica em reformular práticas de relacionamento com o próprio corpo, com nossa forma de estar no mundo social e na nossa ecologia mental. A continuar esta agressão que o ser humano sofre quanto aos processos de grupamento humano padronizado, tele guiado por uma mídia acoplada ao sistema econômico devassador da vida, urge que sejamos corajosos para nos olharmos em primeiro lugar e perceber de que forma somos "atravessados" pelas instituições. Outra forma de se dizer isso seria afirmar que as práticas sociais que não logram êxito, devem-se, na maior parte dos casos, às dificuldades dos indivíduos em seus processos pessoais.
Precisamos, portanto, ampliar nossa capacidade de difundir no campo das ciências e da epistemologia, outras alternativas de desenvolvimento da percepção da singularidade dos seres, não apenas para um avanço concreto na aceitação da biodiversidade, mas para que os potenciais humanos tenham expressividade e sejam libertadores de uma vida mais plena e feliz dos seres. Os indivíduos devem se tornar a um só tempo solidários e cada vez mais diferentes.