Bem Vindo!

"Este blog nasceu como requisito da matéria de Seminário de Integração I, ministrada pelo professor Felipe Aço. O objetivo do blog é o de levar à público nossas experiências e elaborações em sala de aula, tornando assim, possível a interação e integração dos grupos, aflorando ideias e pontos de vista que muitas vezes não se manifestam em sala de aula".
Somos estudantes do 5º semestre do curso de Psicologia, com faixas etárias distintas. Acreditamos que os nossos caminhos não se cruzaram por acaso. Aprendemos muito uma com a outra e o convívio diário nos leva a uma leitura da realidade, a qual compartilhamos e nos induz a sairmos da zona de conforto, de forma desafiadora, e é nesse momento que também surgem divergências para as quais tentamos encontrar um equilíbrio e colocar em prática a constante aprendizagem integrando de certa forma as nossas vidas.

terça-feira, 15 de março de 2011

TEXTO PARA REFLEXÃO: “A PIPOCA QUE SOMOS”

A culinária me fascina. De vez em quando até me atrevo a cozinhar. Mas o fato é que sou mais competente com as palavras do que com as panelas. Por isso tenho mais escrito sobre comidas que cozinhado. Nunca imaginei, entretanto, que chegaria um dia em que a pipoca iria me fazer sonhar. Pois foi precisamente isso o que aconteceu.
A pipoca, um milho mirrado, grãos redondos e duros, sempre me pareceu uma simples molecagem, brincadeira deliciosa, sem dimensões metafísicas ou psicanalíticas. Entretanto, dias atrás, conversando com uma paciente, ela mencionou a pipoca. E algo inesperado na minha mente aconteceu. Minhas idéias começaram a estourar como pipoca. Percebi, então, a relação metafórica entre a pipoca e o ato de pensar. Um bom pensamento nasce como uma pipoca que estoura, de forma inesperada e imprevisível.
A pipoca se revelou a mim, então, como um extraordinário objeto poético. Poético porque, ao pensar nelas, as pipocas, meu pensamento se pôs a dar estouros e pulos como aqueles das pipocas dentro de uma panela. A pipoca é o milho mirado, subdesenvolvido. Fosse eu agricultor ignorante, e se no meio dos meus milhos graúdos aparecessem aquelas espigas nanicas, eu ficaria bravo e trataria de me livrar delas. Não sei como isso aconteceu, mas o fato é que houve alguém que teve a idéia de debulhar as espigas e colocá-las numa panela sobre o fogo, esperando que assim os grãos amolecessem e pudessem ser comidos. Havendo fracassado a experiência com água, tentou a gordura. O que aconteceu ninguém jamais poderia ter imaginado.
Repentinamente, os grãos começaram a estourar, saltavam da panela com enorme barulheira. Mas o extraordinário era o que acontecia com eles: os grãos duros, quebra-dentes, se transformavam em flores brancas e macias, que até as crianças podiam comer. É muito divertido ver o estouro das pipocas!
Mas a transformação só acontece pelo poder do fogo. Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho de pipoca para sempre. Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica sempre do mesmo jeito, a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e dureza assombrosa. Só que elas não percebem e acham que seu jeito de ser é o melhor jeito de ser. Mas, de repente, vem o fogo. O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: a dor.
Pode ser fogo de fora: perder um amor, perder um filho, o pai, perder o emprego ou ficar pobre. Pode ser fogo de dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas causas ignoramos. Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! Sem fogo o sofrimento diminui. Com isso, a possibilidade da grande transformação, também.
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro cada vez mais quente, pensa que sua hora chegou: vai morrer. Dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar um destino diferente. Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada para ela. A pipoca não imagina aquilo de que ela é capaz. Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo a grande transformação acontece: PUM! E ela aparece como uma outra coisa completamente diferente, algo que ela mesma nunca havia sonhado.
Em Minas, piruá é o nome que se dá às mulheres que não conseguem casar. Mas acho que o metafórico dos piruás é muito maior. Piruás são os milhos de pipoca que se recusam a estourar, como aquelas pessoas que, por mais que o fogo esquente, se recusam a mudar. Elas acham que não pode existir coisa mais maravilhosa do que o jeito de ser delas. Ignoram o dito de Jesus: "Quem preservar a sua vida, perde-la-á". A sua presunção e o seu medo são a dura casca do milho que não estoura. O destino delas é triste. Vão ficar milho a vida inteira. Não vão se transformar em flor branca, macia. Não vão dar alegria para ninguém. Terminando o estouro alegre da pipoca, no fundo da panela ficam os piruás, que não servem para nada. Seu destino é o lixo.
Na simbologia cristã, o milagre do milho de pipoca pode ser representado pela morte e ressurreição de Cristo: a ressurreição é o estouro do milho de pipoca.  É preciso deixar de ser de um jeito para ser de outro. 

(Extraído do livro: “O amor que acende a lua” de Rubem Alves)

Pensamento: “Quando a gente acha que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas.”

 COMENTÁRIO DO GRUPO:

A Psicologia tem sua gênese e prática tradicionalmente voltada a normatização e adaptação do comportamento às regras vigentes e diferentes sociedades. Diante de uma leitura crítica de sua atuação, é uma área de conhecimento que acentuou o individualismo como ferramenta de controle e aplicação de sistemas de disciplina, a serviço da sociedade industrial e capitalista, servindo de coadjuvante aos poderes de dominação e governabilidade dos povos e organização das pessoas.
Ainda que haja tendência de práticas libertadoras a forte herança de normalização permanece, seja nas práticas de sujeição aos modelos de uma “sociedade normal”, seja pelas práticas de caracterização de patologias universalizadas e padronizadas, sob as quais se encaixam os sofrimentos e diferenças consideradas anormais.
     E considerando que:
·        Se a Psicologia é uma prática institucionalizada de um ramo da ciência ocidental, que busca a homogeneização e o controle por meio de uma subjetividade individualizada;
·        Se a vida e a ética, bem como o poder se dá nos encontros, se é necessário portanto um olhar heterogenético da construção da vida e dos sistemas e regimes de verdade;
         Questionamos se:
É necessária uma nova prática crítica que seja transgressora da norma, e que semeie um modo questionador das verdades ou da verdade estabelecida, ou cientificamente preconizada?
Seria porventura necessário um espírito anarquista que transversalize o fazer Psi?
É necessária uma epistemologia da desorganização, porém que não seja individualista, pois que se faz no encontro, nasce do encontro da diversidade, se estrutura na pluralidade, tem sua gênese na heterogeneidade, e conserva e afirma das exceções, fragilizando as regras, e que justamente por isso é dinâmica e volátil?
Não precisaria a Psicologia ser anarquista, transgressora e desorganizadora, que rompa a homogeneidade pretendida e afirme o indivíduo, porém, remetendo-o à construção de si e de suas desconfianças de verdade no coletivo, no encontro com o outros, as outras?
 Numa linguagem parabólica, figurada:
A Psicologia pode servir como o fogo que aquece a água que está dentro do próprio grão de milho, que por si executa a transformação de seu estado fechado, encapsulado, desagradável para a fruição para um estado de maioridade (o grão no mínimo triplica seu tamanho, seu lugar no mundo), de estética (o grão de milho que nas culturas astecas e mais era considerada uma “gota” do sol, tem agora a cor branca, resultado da união de todas as cores, um símbolo da diversidade. Além disso é agradável ao paladar.) e de subjetivação (cada grão passa pelo mesmo processo – a água evapora em seu interior – porém cada grão forma uma pipoca de diferentes formas, aspectos e tamanhos).

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